Em Portugal, o Acidente Vascular Cerebral (AVC) é a primeira causa de mortalidade e morbilidade. Segundo a Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebralpor hora, três pessoas sofrem um AVC, um destes não sobrevive e um ficará com sequelas graves“.

Já os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística e da Plataforma da Mortalidade da Direção Geral de Saúde referem que “os acidentes vasculares cerebrais continuaram a estar na origem do maior número de óbitos em 2019 (10 975), representando 9,8% da mortalidade e uma taxa de 106,5 mortes de residentes por 100 mil habitantes.”.

É crucial estar atento e reconhecer o mais cedo possível os três sinais de alarme de AVC: boca ao lado, falta de força num membro e dificuldade em falar. Pois quão mais rápido contactar o 112, para ser ativada a via verde AVC, maior é a possibilidade de ser oferecido tratamento, diminuindo muito as sequelas do AVC.

 

1. O que é o AVC

O AVC é uma doença caraterizada pelo início agudo de um défice neurológico que persiste por pelo menos 24 horas, resulta de um distúrbio na circulação sanguínea cerebral e causa impacto no sistema nervoso central.

Neste evento o tecido nervoso fica privado da circulação sanguínea, sendo esta quem mantem as células nervosas ativas fornecendo oxigénio e glicose. Esta interrupção numa determinada área do cérebro tem por consequência uma diminuição ou paragem da atividade funcional dessa área.

O AVC pode ser causado por dois mecanismos diferentes: oclusão de um vaso provocando isquemia e enfarte do território dependente desse vaso, ou rutura vascular. Este distúrbio pode ocorrer de forma súbita, devido à presença de fatores de risco vascular ou por defeito neurológico, e causa lesões cerebrais que resultam no comprometimento de funções cerebrais.

São apresentados como fatores de risco: a hipertensão (tensão arterial elevada), tabagismo, fibrilação auricular (arritmia cardíaca comum), diabetes, colesterol (gordura no sangue em níveis elevados), consumo excessivo de álcool, obesidade e aterosclerose (desenvolvimento de placas nas paredes das artérias que podem originar o entupimento das mesmas).

2. Os vários tipos de AVC

Como já foi mencionado, o tipo de AVC depende do mecanismo que o originou, podemos ter assim dois tipos de AVC, que por sua vez podem ser divididos em subtipos, como podemos ver na seguinte tabela.

 

AVC Isquémico AVC Hemorrágico

Lacunar

Trombótico

Embólico

Intracerebral

Subaracnoide

  • AVC Isquémico

O AVC Isquémico é induzido pela oclusão de um vaso ou redução da pressão de perfusão cerebral, ou seja, o tecido cerebral é privado do fornecimento de sangue arterial. Derivado a este acontecimento segue-se um sofrimento celular que, conforme a sua intensidade, poderá manifestar-se numa perturbação funcional.

Se esta privação é de curta duração, menos de 24 horas, a disfunção é reversível e estamos perante um Acidente Isquémico Transitório (AIT). Quando a isquemia persiste para além das 24 horas, lesões definitivas e irreversíveis podem instalar-se e nesse caso falamos de um Enfarte Cerebral.

Um AVC é Lacunar quando é ocasionado por enfartes muito pequenos, que ocorrem somente onde arteríolas perfurantes se ramificam diretamente de grandes vasos.

 Um AVC é Trombótico quando o processo patológico responsável pela oclusão do vaso se desenvolve no próprio local da oclusão. Existem dois tipos de tromboses: a trombose venosa – caracteriza-se pela presença de um volumoso coágulo fixado na parede interior de uma veia (trombo); e a trombose arterial – resultam da presença de material ateromatoso que oclui o lúmen do vaso.

 Já um AVC é Embólico quando se verifica uma a oclusão arterial por um corpo estranho (embolo) em circulação, que são libertados na corrente sanguínea e que se deslocam até às artérias cerebrais.

  • AVC Hemorrágico

Ao contrário da isquemia na hemorragia cerebral existe extravasão de sangue para fora dos vasos, este pode derramar para o interior do cérebro – provocando uma hemorragia intracerebral; ou para o espaço cheio de fluido entre o cérebro e a membrana aracnoide – provocando uma hemorragia subaracnoide

A hemorragia cerebral encontra-se intrinsecamente relacionada com a hipertensão arterial, pois o aumento crónico da pressão nas artérias, sobretudo se ignorado ou maltratado, lidera a uma fragilização das paredes arteriais.

 

 

3. Lesões e áreas que podem ficar alteradas

A localização e a extensão exatas da lesão provocada pelo AVC determinam o quadro neurológico apresentado por cada pessoa. O seu aparecimento é normalmente repentino, variando entre sintomas leves ou graves, podendo estes ser temporários ou permanentes.

A presença de danos nas funções neurológicas origina défices a nível das funções motoras, sensoriais, percetivas, mnésicas, da linguagem, e do comportamento. A nível de alteração das funções motoras podemos salientar: alteração do tônus, presença de reações associadas, perda de mecanismo de controlo postural, hemiparesia, hemiplegia, ataxia, entre outros.

Já no que diz respeito a alterações das funções sensoriais as que são frequentemente observadas são os défices sensoriais superficiais, propriocetivos e visuais.

Relativamente às alterações das funções percetivas estas dependem do local da lesão, lesões no hemisfério não dominante produz distúrbios de perceção (ex.: figura fundo, posição no espaço, constância da forma, perceção da profundidade, relações espaciais e orientação topográfica). A apraxia e a agnosia também são perturbações frequentes em indivíduos que sofreram um AVC, bem como a heminegligência.

Podem existir alterações das funções mnésicas, tais como amnésia ou confabulação.  Dependendo do tipo e localização da lesão, podem surgir diferentes complicações, tanto a nível da linguagem (afasia), dos défices motores ao nível da fala (disartria) e/ou da deglutição (disfagia).

Por último, também são observáveis alterações no comportamento, os indivíduos com lesão do hemicorpo direito exibem mais comportamentos receosos e ansiogénico, bem como, hesitação e insegurança. A labilidade emocional é frequentemente encontrada em casos de hemiplagia, sendo comum a instabilidade de emoções.

 

 

4. Que profissionais deve procurar

No caso de AVC a intervenção deve ser individualizada dependendo de uma avaliação cuidada de vários fatores, tais como o tipo de AVC, o local e extensão da lesão e as características individuais da pessoa antes do AVC.

A intervenção deve ser iniciada o mais cedo possível de forma intensiva e por vezes de longa duração, tendo como objetivo a melhoria da qualidade de vida da pessoa e dos seus familiares / cuidadores.

A intervenção poderá ser realizada através de uma equipa multidisciplinar constituída por: Neuropsicólogos, Terapeutas da Fala, Fisioterapeutas, Terapeutas Ocupacionais, Enfermagem de Reabilitação, Nutrição, Fisiatra, Ortoprotesia e outras especialidades.

A Neuropsicologia tem um papel importante na reabilitação das funções cognitivas (por exemplo memória e capacidade de concentração), estabilização comportamental e emocional. Maioritariamente tem como objetivo promover a inserção nas atividades de vida diária, ou promovendo a inserção de estratégias para tornar a pessoa o mais funcional possível.

Dependendo do local e do tipo de lesão e das sequelas por elas advindas a Terapia da Fala poderá ter um papel crucial na área da linguagem (afasia – dificuldades de nomeação, expressão e compreensão ao nível oral ou escrito), alterações motoras (disartria – perda da capacidade de articular as palavras de forma normal) e alterações na deglutição (disfagia – dificuldade de transporte de líquidos, sólidos ou ambos da faringe até ao estômago).

A Fisioterapia terá um papel importante na reabilitação motora através da reeducação do equilíbrio, da marcha, promoção da mobilidade, treino de atividades de vida diária tendo como objetivos promover a funcionalidade, a independência e a melhoria da qualidade de vida.

O Terapeuta Ocupacional centrar-se-á na capacitação da pessoa em atividade de vida diária nos diferentes contextos. Tem como objetivo a reintegração na comunidade, na adaptação do ambiente e capacitação do familiar/ cuidador.

O Fisiatra e outros médicos elaboram estratégias e plano de intervenção terapêutico que envolva a equipa pluridisciplinar.

A Enfermagem de Reabilitação através da reeducação motora funcional, motora e treino de atividade de vida diária e ensino sobre uso de produtos de apoio.

O Nutricionista elabora um plano de alimentação equilibrado, o respetivo tratamento e prevenção ao nível alimentar.

A Ortoprotesia identifica e adapta os dispositivos biomecânicos nos diferentes contextos como em casa, ou acessibilidades (barreiras), como por exemplo no trabalho.

Os diferentes profissionais têm como objetivo promover a funcionalidade e qualidade de vida diária. Também devem sempre ser consideradas estratégias terapêuticas comportamentais que englobem modificações em casa e nos locais onde a pessoa com AVC fique durante o dia. Fique atento às nossas publicações no Facebook e Instagram onde falaremos mais sobre estas estratégias!

 

Dra. Inês ViegasTerapeuta da Fala

Dra. Mara CandeiasPsicóloga Clínica

 

 

 

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