O que muda nas férias?

 

Passados já 4 meses após o decretado estado de emergência, estaremos nós em condições de fazer um balanço sobre aquilo que foi a vivência familiar ao longo destes meses?

Como se sentiram as famílias? Terá sido o maior desafio das famílias com crianças em idade escolar, garantirem a frequência dos filhos às aulas online e à telescola, e a realização dos trabalhos escolares? Ou terá sido a gestão das rotinas desreguladas, os sonos trocados e hábitos invertidos?

O que mudou desde há 4 meses para agora? Sentimo-nos diferentes? Estaremos mais disponíveis para olhar o outro com tudo o que o preenche? Estaremos mais motivados para agarrar a vida ou menos esperançosos em relação ao futuro?

Parece que se há algo que a pandemia trouxe, para além do medo e da certeza de que não controlamos nada, foi o confronto com a realidade familiar emocional de cada lar (e de cada um, individualmente), a consciência do que cada família tem de melhor mas também das suas maiores fragilidades. Parece que esta pandemia veio abrir novos caminhos, perspetivas e possibilidade de fazer novas escolhas. Escolher olhar e transformar aquilo que precisa ser transformado ou escolher deixar tudo igual. Afinal parece que fazer escolhas constitui um dos maiores desafios da nossa existência!

Então, o que podemos transformar durante estes meses de férias?

Podemos seguramente transformar as relações. Podemos dedicar-nos verdadeiramente àqueles com quem vivemos, dedicar-lhes tempo que permita detetar fragilidades e potencialidades, detetar aquilo que é meu e aquilo que é do outro. Um tempo livre de preconceitos, julgamentos, intenções. Apenas estar e observar! Desfrutar o presente, sem querer antecipar o futuro. Nunca esquecendo que só transformando a relação que temos connosco próprios é que é possível transformar as relações com os filhos, pais, irmãos, avós. A escolha tem que partir de dentro e a transformação acontece sempre de dentro para fora. Não é o outro que muda, somos nós. A responsabilidade de transformar o que precisa ser transformado é, sempre, só nossa.

A pandemia mostrou-nos de forma evidente que se colocarmos a vida a nu, sem os adereços que a temperam e nos distraem, o que sobra são exatamente as relações que mantemos com o nosso eu e, consequentemente, com os outros (ou a falta delas). A pandemia trouxe a urgência de nos pensarmos e olharmos, de fecharmos as portas do passado para poder viver o presente, de agarrar a coragem para sairmos da zona de conforto e nos desafiarmos. Desta vez, de nos desafiarmos emocionalmente.

Então, o que muda nestas férias?

Pode mudar a forma como olhamos comportamentos e reações. O que está por trás da birra que um filho faz? O que está por trás do cansaço constante da mãe ou do pai? O que está por trás da inação da mulher ou do marido? O que está por trás do vício do trabalho?

O que está por trás desse tempo que é tão raro e que tivemos a mais, e da possibilidade que ele nos traz de refletirmos e pensarmos no nosso lugar?

É tempo de olharmos mais e melhor, para quem está ao nosso lado e para dentro.

 

 
Dra. Inês Chaves – Psicóloga Clínica